Voluntários na Casa Grande-ATL da Galiza
Engenheiro de formação, foi na engenharia financeira que passou grande parte da sua vida profissional, a gerir empresas como a Águas do Sado, uma das muitas onde deixou a sua marca.
Christian Andersen, tem uns olhos azuis brilhantes e apesar do nome, de origem dinamarquesa, sempre se sentiu português por inteiro. Porque foi aqui que nasceu, cresceu e ganhou consciência de si. E do profundo azul dos seus olhos vem a convicção das suas escolhas. Nota-se essa afirmação de escolha quando fala do tempo da tropa em que escolheu ser um dos militares de Abril, na juventude do seu lugar de tenente, quando o 25 de Abril eclodiu. Nota-se no olhar convicto quando fala de fé e de dar aos outros. E de quando diz, convicto que “a influência dos pais foi marcante para as suas escolhas”.
Da vida de gestor lembra o stress constante “e a saúde que estava em muito mau estado”. Sublinha os atritos que mantinha com o estado e a falta de visão dos sindicatos “que preferiam aumentos de 5% à formação profissional dos trabalhadores” e suspira, que “sem saber muito bem porquê, era sempre chamado para tomar conta de uma empresa para recuperá-la do mau estado financeiro em que estas se encontravam”.
Christian decidiu pela qualidade de vida. A experiência ganha em décadas de trabalho, permitiu-lhe estabelecer-se agora como consultor “porque assim posso escolher os clientes que quero”. Para além disso, passou a ter mais tempo para si e para os outros e assim “ir ao encontro do que tinha cá dentro”.
Há três anos contactou pela primeira vez com a casa grande e passou a colaborar com o ATL. Como voluntário contribuiu para o projecto de mecenato que deu origem à construção do edifício da Casa Grande.
Uma preocupação social que lhe foi incutida mais uma vez por influência da família, oriunda da alta burguesia, mas atenta aos desequilíbrios de um país pobre. “Inicialmente”, diz Christian, “e mesmo sem consciência política ou social”, sentiu “necessidade de ajudar os outros”. Foi essa experiência inicial na juventude que o “acordou para a miséria que vivia paredes-meias com ele, num dos concelhos mais ricos do país.”
“Não é cómodo ser voluntário. E nem sempre se conseguem ultrapassar os nossos egoísmos comezinhos”, diz e acrescenta irónico “alguns de nós ainda acreditam que fazer o bem serve para ser estimado pelos pobrezinhos” entre alguns que se oferecem como voluntários, mas no balanço da sua experiência nesta área, Christian diz que “recebe mais do que dá” porque “o que se dá vem duma fonte solidária, contra a corrente individualista, quase como se houvesse em nós o instinto de oferecer algo gratuito aos outros”.
Os olhos de Christian brilham quando fala divertido das suas primeiras experiências de trabalho voluntário: “dei aulas de catequese a que ninguém faltava e até ia ganhando alunos, participei numa comissão para a construção de uma nova igreja da paróquia do Estoril, mais recentemente e agora estou aqui a fazer o que posso e o que sei no ATL da Galiza”, mas aquele brilho quase travesso fica mais baço quando diz que nestas coisas do trabalho voluntário “para além daquilo que fazemos na nossa família e aos que estão mais próximos, o resto do panorama é triste” “uma coisa na qual acredito profundamente, é que a nossa felicidade só se alcança quando nos damos aos outros”
Como homem de negócios que esteve à frente de muitas empresas durante tanto tempo Christian acredita que a responsabilidade social das empresas começa a alterar-se: ”o conceito de obra social vai mudando devagar pois ainda é difícil convencer gestores na nossa sociedade mercantilista a intervirem e colaborarem na intervenção social da região em que estão a a operar. Mas já existem iniciativas em que são as próprias empresas a apoiarem e incentivarem os seus trabalhadores ao trabalho voluntário. E se o estado se isenta de uma intervenção social séria, o exemplo pode vir destas empresas, mesmo se não é da sua natureza, a solidariedade, que dar exemplos onde o estado não pontua.”
E se a maior parte de nós não dá por acaso, o facto é que na área do voluntariado, independentemente das razões que levam cada um a oferecer-se, “retiram-se lições de vida nas pequenas ferramentas realistas com que contribuímos com os nossos saberes e capacidades, para que outros possam ser um pouquinho mais felizes, ou para minorarmos a miséria em que se encontram”. E mesmo se a tendência do trabalho voluntário “continua a ter uma marca “sem compromisso”, não perdurando muito - ainda nos custa muito sair do berço de ouro em que vivemos - o facto é que esse pouco que se dá, mesmo pontualmente, tem feito muito e marcado a diferença numa sociedade cada vez mais exclusiva, onde os excluídos são cada vez mais excluídos.
Christian não se considera um exemplo, uma perspectiva comum à grande maioria dos que se prestam ao trabalho social voluntário, mas sublinha com convicção humilde: “uma coisa na qual acredito profundamente, mesmo quando o meu egoísmo, comodismo e outros "ismos" não me deixam ser coerente: é que a nossa felicidade - aquilo que toda a gente tenta atingir - só se alcança quando nos damos aos outros. Não é uma solução cómoda, mas não há nenhuma que consiga ser, ao mesmo tempo, verdadeira e fácil...”EF
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